Dicas para abordar editoras como profissional de texto
E o que priorizar como autor iniciante
Como prometido, hoje vou responder duas questões mais simples (que eu sempre dou um jeito de tornar mais complexas 🙄). Para a primeira pergunta, entrevistei 9 editores para dar dicas para profissionais de texto que estão à procura de trabalho. Também falo de escolhas no percurso da publicação como autor iniciante, indico um livro para aprimorar sua escrita, e revelo a pergunta da próxima quinzena.
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Quanto tempo espero antes de cobrar uma resposta?
Diana, quanto tempo devo esperar antes de "cobrar" uma resposta de pedido de teste de revisão/preparação/tradução para uma editora tradicional? Enviei alguns emails em outubro e até agora não tive resposta. Não enviei para emails genéricos (SAC, RH, etc.), mas sim para pessoas editoras. Todes dizem que a demora é algo normal no mercado editorial, mas quanto tempo é esse "normal"?
Shiv Roy do mercado editorial (Recife, PE)
Cara Shiv,
Achei que o melhor jeito de responder sua dúvida seria perguntar para quem lida com isso no dia a dia, então entrei em contato com pessoas de 9 editoras, de tamanhos e linhas editoriais bem diferentes, para saber o que funciona para cada uma delas. (E fica aqui meu muito obrigada para todos que responderam e tiraram um tempinho para me ajudar a passar uma informação melhor aos leitores! 🖤)
A maioria das pessoas citou um mês como o tempo para você mandar um alô caso não tenha recebido resposta alguma ao e-mail inicial. Mas existe uma variação de acordo com o número de lançamentos por mês: editores que trabalham com um fluxo maior de livros foram mais diretos em dizer que essa cobrança é natural e esperada. Enquanto editores que trabalham com uma lista mais enxuta, e que portanto têm menos serviços para passar, disseram que dificilmente encontrariam oportunidade para um novo tradutor em menos de um mês, então preferem arquivar essas mensagens e entrar em contato quando houver necessidade de procurar novos colaboradores.
Vale a pena avaliar caso a caso, Shiv, mas eu diria que aguardar um mês é um bom parâmetro. Mande uma segunda mensagem perguntando se a pessoa viu seu e-mail, e pare por aí. Se não conseguir resposta depois disso, interprete que essa pessoa ou não tem espaço para novos profissionais, ou prefere te escrever apenas quando for o momento de passar um teste. As pessoas que consultei sugerem entrar em contato novamente apenas quando você tiver mais experiência, aguardando pelo menos 6 meses entre as mensagens (de novo, essa janela varia de acordo com a quantidade de livros que a pessoa edita).
Tudo isso nos informa, então, que você foi muito paciente ao esperar 8 meses! Como você fez esse contato em outubro, é possível que tenha dado o azar de pegar as pessoas bem no meio da correria que circunda a Feira de Frankfurt… evite mandar mensagem na época das grandes feiras de vendas de direitos (as principais são as de Frankfurt, Londres e Bologna), porque são períodos em que o tempo fica ainda mais escasso e existe um risco maior que o normal do seu e-mail se perder.
Você disse que escreveu para e-mails de profissionais específicos, não contatos gerais de editoras, e uma das pessoas me falou da importância de mencionar como você conseguiu esse contato: se vocês já se falaram alguma vez, se foi outra pessoa que te passou, ou se viu em algum site.
Foi um consenso que os editores gostariam de ter mais tempo para passar testes e dar mais retorno às pessoas, mas que o dia a dia da função acaba tornando isso difícil. Por causa disso, decidi dar um passo adiante e perguntar o que precisa constar no seu e-mail de apresentação e o que faria você se destacar (assim aumentamos as chances de você já ter uma resposta positiva logo de cara). As respostas mais mencionadas são aquelas que você já espera: currículo, formação e cursos, idiomas que domina, experiências profissionais ou em outros países. Mas me deram a dica de colocar essas informações principais já no corpo do texto, em vez de deixar apenas em anexos.
Outro ponto muito mencionado: mostrar que você conhece o catálogo da editora. Seja porque já trabalhou com livros semelhantes, ou porque tem afinidade com o gênero, é importante indicar que você conhece a linguagem específica daquele tipo de livro. Um romance erótico tem um texto bem diferente de uma fantasia épica, que é muito diferente de um juvenil contemporâneo, que é diferente de um clássico russo. E você pode dizer que isso é óbvio, mas não é óbvio para a pessoa que recebe o e-mail que você sabe disso, então é importante demonstrar.
Por último, eu mesma acabei descobrindo uma coisa nova: os editores querem saber, também, de características e conhecimentos seus para além do profissional, que possam te associar a algum dos livros que eles tenham adquirido. E isso faz sentido, porque um editor quer dar a melhor chance possível para aquele livro ser bem-sucedido, então não basta ser um profissional “bom o suficiente”, com a formação correta e que respeite prazos: ele está procurando o profissional certo para aquele livro. Alguns exemplos de informações que se revelaram úteis para as pessoas que entrevistei:
“Já contratei colaboradores novos mais de uma vez por saber que teriam conhecimento específico sobre alguma área. Por exemplo, uma vez chamei uma tradutora que tinha feito curso de aeromoça e sobrevivência na selva para um livro que tinha um acidente de avião, e uma revisora que mencionou como quem não quer nada que era muito fã de O mágico de Oz para um livro que era uma releitura do clássico. Também já aconteceu, por exemplo, de eu indicar uma tradutora que trabalhava com romance YA comigo para outro editor porque ele estava precisando de preparador com conhecimento em Virginia Woolf e eu sabia que ela tinha acabado um mestrado sobre isso.”
“Teve um livro que eu queria muito passar pra um tradutor que fosse vegano ou vegetariano, que é um detalhe que eu não tenho como saber. É o tipo de coisa que seria útil, mas não é uma informação que a gente pede pras pessoas.”
Juntando tudo, eu diria para você tentar de novo, agora que já se passou bastante tempo, com um parágrafo falando de quais serviços você presta, quais idiomas domina, sua formação e experiências relevantes. E um segundo parágrafo se apresentando como pessoa de forma mais geral. Se venda pelas características que te diferenciam dos vários outros profissionais que também estão enviando e-mails. Mencione que você ama videogames, que cursou arquitetura, que é escritora de fantasia, que leu todos os romances da Nora Roberts, ou o que for. Tudo isso faz com que você passe de “mais uma pessoa que está me pedindo trabalho” para “uma pessoa que pode ser boa para esse livro que está na minha programação”.
Boa sorte, estou torcendo para você conseguir muitas respostas dessa vez!
Prioridades de uma escritora
Queria saber sobre Agenciamento Literário: como autora que está começando a publicar agora, devo ir atrás de uma agência ou focar em publicar o primeiro livro e chamar a atenção de alguma para o lançamento dos próximos projetos?
Amelie M. (São Paulo, SP)
Cara Amelie,
Eu amo que você falou em focar: como o ofício de escritora acaba indo além da escrita, a decisão de qual tarefa priorizar acaba sendo importante no dia a dia. Vou voltar um pouco no tempo para dar minha sugestão de foco a partir do momento em que você decide escrever um livro, ok?
Eu acho que a primeira coisa que você deve fazer é pesquisar autores nacionais contemporâneos que escrevam o mesmo tipo de história que você. Ler clássicos é importante, ler autores estrangeiros é importante, mas ler aqueles que serão, de fato, seus colegas é o mais importante de tudo. Primeiro para você conhecer o que já está sendo feito no gênero, e não achar que está inventando a roda. Depois para conhecer ferramentas que podem te ajudar a desenvolver sua escrita, e quais são possíveis expectativas do público para o seu tipo de história. E, por último, como pesquisa, para descobrir que agentes os representam, e quais editoras estão publicando esse tipo de livro.
Eu não sei se você é do tipo de pessoa que precisa parar de ler outros livros enquanto escreve, ou se consegue conciliar as duas coisas. Mas de qualquer forma, o melhor é você focar nessa pesquisa e nessas leituras antes de começar a escrever.
Com essa bagagem, você inicia a fase de escrita, e coloca o foco nela. Mas sejamos realistas: você vai ter dias em que analisar a pintura da parede vai parecer mais interessante do que escrever o próximo parágrafo. Pegue uns dois ou três desses dias e pesquise as agências e editoras dos autores que você encontrou. Veja se os sites ou redes sociais mencionam períodos de recebimento de originais, ou sessões de pitch. Se inscreva para acompanhar as notícias dessas empresas, seja via newsletter, instagram ou o que for. Veja se os profissionais envolvidos deram entrevistas, ou se participaram de eventos e podcasts que possam te informar sobre as preferências e o modo de trabalho deles. Mas atenção: não se perca nessa pesquisa. Dois ou três dias é foco o bastante, e aí você volta a priorizar a escrita.
Ao longo do processo de escrita, vá acompanhando as notícias das pessoas/empresas que você mapeou, para ir se aprofundando no mercado e para ver se surge alguma oportunidade. (Não existe muito o que você possa fazer além de esperar, por isso é uma tarefa de segundo plano.) Se surgir, ótimo, vá atrás se possível! Mas se não acontecer, continue focando na sua história: coloque o ponto final, mande pra leitores beta, edite, revise.
E então chegamos na parte que você mencionou: focar em arranjar um agente ou tentar atrair atenção do mercado publicando esse primeiro livro sozinha? Eu não sugiro que você considere o agenciamento como etapa necessária antes da publicação só porque existem poucos agentes no Brasil, que precisam limitar a quantidade de clientes para fornecer um acompanhamento de qualidade, então é difícil mesmo conseguir um. (Mas aos poucos estão surgindo mais agentes no mercado brasileiro, então torço para o acesso a esses profissionais melhorar nos próximos anos.) Mas, se você fez uma boa pesquisa lá no começo, encontrou seus colegas de gênero, e acompanhou as informações direitinho ao longo dos meses, eu acho que vale a pena você tentar entrar em contato com as agências e editoras que estão na sua lista. Você já está disposta a publicar de forma independente, então adote uma atitude de “se rolar, rolou”. E se não rolar, publique mesmo: muitos autores conseguiram agenciamento e interesse de editoras dessa forma.
Indicações e aleatoriedades:
A edição deste ano da PerifaCon está confirmada para 30 de julho, mas precisa do seu apoio para acontecer! Para quem não conhece, PerifaCon é uma convenção de cultura nerd/pop que acontece anualmente em diferentes bairros periféricos de São Paulo. Apesar do sucesso das últimas duas edições, eles estão com dificuldade para arranjar patrocinadores e, por isso, precisaram abrir um financiamento coletivo. É um projeto de democratização da cultura que merece seu apoio, se você tiver condições. (Alô, pessoal de editoras: eles têm uma faixa de apoio para empresas que oferece contrapartidas para divulgação da sua marca.)
Vanessa Ferrari, que eu tive a sorte de conhecer quando trabalhava na Companhia das Letras, acabou de lançar um ótimo livro para quem pretende se profissionalizar como escritor ou editor. Ela parte de sua vasta experiência com textos de autores iniciantes para identificar seis tipos de narrativa, apontar armadilhas comuns em cada uma, e te ajudar a fazer escolhas linguísticas coerentes com seu projeto literário.
Érico Assis fez uma coluna muito boa para avaliar se quadrinhos são mais caros no Brasil, comparando com o preço em outros países. Em uma análise que é facilmente transponível aos livros, fica claro que nossos maiores vilões são a desigualdade social e o baixo poder aquisitivo dos brasileiros.
O IBGE organizou um concurso de fotos tiradas pelos recenseadores, e tem imagens muito bonitas de diferentes partes do Brasil! As fotos estão divididas em três categorias (Habitação, Paisagens urbanas e Paisagens rurais) e você pode votar nas suas favoritas aqui.
A próxima questão é:
Acredito que o mercado é baseado nas pessoas do "velho testamento", poucas marcas estão sendo renovadas para o futuro e pensam em incluir esse futuro.
Como você acredita que as editoras, livrarias, distribuidoras e gráficas devem pensar para fazer essa mudança? Como nós (público consumidor ou até fornecedor) podemos fazer para que elas deixem de ter esse "preconceito" com o novo? Quais são as boas práticas ideais, sendo do marketing, vendas, Recursos Humanos...?
Anônima (São Paulo, SP)
Até a próxima!
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